As três idades - Manuel Bandeira

A vez primeira que te vi,
Era eu menino e tu menina.
Sorrias tanto... Havia em ti
Graça de instinto, airosa e fina.
Eras pequena, eras frnazina...

A ver-te, a rir numa gavota,
Meu coração entristeceu
Por que? Relembro, nota a nota,
Essa ária como eterneceu
O meu olhar cheio do teu.

Quando te vi segunda vez,
Já eras moça, e com que encanto
A adolescência em ti se fez!
Flor e botão... Sorrias tanto...
E o teu sorriso foi meu pranto...

Já eras moça... Eu, um menino...
Como contar-te o que passei?
Seguiste alegre o teu destino...
Em pobres versos te chorei
Teu caro nome abençoei.

Vejo-te agora. Oito anos faz,
Oito anos faz que não te via...
Quanta mudança o tempo traz
Em sua atroz monotonia!
Que é do teu riso de alegria?

Foi bem cruel o teu desgosto.
Essa tristeza é que diz...
Ele marcou sobre o teu rosto
A imperecível cicatriz:
És triste até quando sorris...

Porém teu vulto conservou
A mesma graça ingênua e fina...
A desventura te afeiçoou
À tua imagem de menina.
E estás delgada, estás franzina... 

Manuel Bandeira


Recife, 19 de abril de 1886 — Rio de Janeiro, 13 de outubro de 1968


Comentários

Meu_nome_Mulher disse…
Boa Noite

Os meus sinceros parabéns pela belíssima "riqueza" lúdica e erudita que tem nos seus blogues. Um trabalho exaustivo e muito valorizável. Sou uma Amante da Poesia, eu mesma, escrevo uns "rabiscos" que não me atrevo a chamar de poemas, prefiro dizer que são gritos da minha alma.

Grata pela sua atenção em me visitar e comentar sobre um grande amigo, que infelizmente já fez a sua "passagem".

Os meus cumprimentos