Casualmente vi o filme na programação da SKY. Não sabia que era uma refilmagem de 1967. A versão original, do diretor John Schlesinger, foi premiadíssima. Um elenco de renome: Julie Christie é Bathsheba Everdene, Terence Stamp, o belo sargento Troy, Peter Finch interpreta William Boldwood e Alan Bates, Gabriel Oak.
Quando soube que o filme era baseado em um romance do Thomas Hardy, cujo título é Far From the Madding Crowd, quase desisti de assistir, devido às características do autor: um pessimista radical, um niilista. O caso é que eu tenho um “problema pessoal” com Thomas Hardy, algo de longa data. Eu tinha uns dezenove anos e cursava Letras na PUC de Minas, em Belo Horizonte. Leitora voraz, desde aquela época, jamais admiti orientação para leituras, gostando eu mesma de descobrir os bons autores. Foi assim que me caiu às mãos o romance Judas, o Obscuro, de Thomas Hardy. Apesar de saber bem mais tarde que o livro é considerado uma obra-prima da literatura universal, lê-lo me fez muito mal, provavelmente porque eu era ainda muito jovem e imatura. Seu pessimismo corrosivo, radical, raiando ao niilismo, envenenou-me durante anos.
Felizmente, não segui minha intuição e vi o filme. É uma história humana, linda, passada em Dorset, na Inglaterra. A fotografia do filme é belíssima, o elenco, perfeito: Carey Mulligam, Mathias Schoenaerts, Michael Sheen e Tom Sturrige. A crueza da vida lá estava, bem ao gosto de Thomas Hardy, em um mundo de decepções, amargura, onde todos os caminhos acabam em alçapões, ninguém é feliz e algo que torna o filme bem moderno: as escolhas dos seres humanos, orientadas pelo coração, são sempre as mais erradas, mais fatídicas.
Como não vi a versão original, de 67 e não li o romance, pergunto-me se o happy end da refilmagem está no livro do amargo Thomas Hardy, ou foi uma concessão (?) cinematográfica do diretor, Thomas Vinterberg. Imaginem uma mulher solitária e forte, independente, amada por dois homens (um pobre e sincero, outro rico e amargo) que opta, é claro, por um anti-herói belo, de caráter duvidoso, estroina, irresponsável, falso e jogador. É assim a história de Bathsheba Everdene, jovem com dificuldades financeiras, que é pedida em casamento pelo criador de cabras, Gabriel. Logo após ela herda uma fazenda e contrata Gabriel, que ficara pobre, para ser seu capataz. O vizinho maduro e rico, William Boldwood também se apaixona por nossa voluntariosa heroína, que não o aceita e vai amar o Sargento Troy, lindo conquistador mau caráter. Essa fraqueza da mulher aparentemente forte torna o filme bem moderno.
Outra dedução que pincei, no final do filme é sobre filmes ingleses, algo que não posso provar, porque é muito pessoal. Deixo aos cinéfilos ratificar ou retificar minha assertiva. É arte muito inglesa de iniciar um filme repleto de delicadezas e após mostrar uma história terrível, chocante, mesmo com certa elegância. Refiro-me ao filme Não Me Abandone Jamais (Never Let Me Go), baseado no romance de Kazuo Ishiguro (2005), dirigido por Mark Romanek. O filme começa docemente, com uma bela história de amor, até se descobrir que os jovens são espécimes científicos, criados em laboratórios, para fornecer os seus órgãos a pacientes gravemente enfermos. Assim, é uma terrível história de suspense e ficção científica.
Como tenho o mau hábito de “criar casos” em assuntos literários, interessei-me pelo romance de Kazuo Ishiguro, autor nipo-britânico. Briguei com a tradução do livro, com uma inaceitável próclise e não o li, porque ele começa assim: __Me chamo Kathy. Realmente, tradutor é traidor...
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