Recebi em junho, da Primavera Editorial, o livro mais recente de Menalton Braff, O Peso da Gravata. Sem conseguir segurar minha curiosidade, após ler o primeiro conto, que é ótimo, escrevi um comentário. Só agora, após finalizar a coletânea, volto a falar sobre a obra.
Não é necessário repetir sobre a fertilidade da produção literária do autor, o grande estilista que é Menalton, a riqueza de sua linguagem, mas é necessário realçar a diversidade dos temas dos contos e a impressionante variedade de procedimentos literários que emprega, como autor maduro e consagrado de contos e romances.
No primeiro conto, que tem o mesmo título da obra, no final ele usa o Realismo Fantástico, técnica atraente que o autor repetirá em O Violinista e também em O Imperador de Papel, este último mais enriquecido ainda com outra hipótese na trama, de um possível complexo caso de transmigração de almas.
O conto Quatro Anos Depois é também surrealista: o suicida que visita seu túmulo e narra sua desdita. Morreu de amor. Ou por não saber se era amado; até o final resta a dúvida. Castigo eterno. Em Janela do Velho Sobrado, o mistério permanece até o final, quando Elyseu parte, levado pela estranha figura, com dois buracos negros no rosto; a face macabra tudo diz. É a descrição perfeita das sensações preambulares da morte.
Uma característica de MB, é o emprego de frases curtas, às vezes o estilo quase telegráfico e o uso da próclise no início das orações, para realçar a oralidade, o que dá também mais leveza ao discurso. No conto Acerto de Contas, são vários exemplos notáveis; com poucas palavras, o narrador resume toda uma situação de vida da personagem e é também nesse conto que há o emprego de uma rara figura de linguagem, a hipálage, que consiste em atribuir-se a uma palavra o que pertence a outra, na mesma frase: “Trêmulas e indecisas, as primeiras sombras da noite entraram atrás de Belmiro no bar do Romeu” ...
No conto Uma Cara Muito Branca, uma personagem é Átropos, figura grega inflexível, uma das três Moiras da Mitologia Grega que regram os destinos, sendo sua contraparte romana conhecida como Morta, a mais velha das Moiras, a Inevitável, a inflexível. A mesma personagem no famoso poema Consoada, de Manuel Bandeira, que a chama pelo epíteto de A Indesejada das Gentes, é muito mais séria e amigável. A de Menalton é um pesadelo.
Quase todos os outros contos que se seguem apresentam tramas inusitadas, de sensações estranhas, clima de pesadelos, pessoas amargas, com suas tragédias terríveis, sem solução, insuladas no seu mundo sombrio. Metáforas dos tempos modernos? E em todos, a preferência pela narrativa truncada, jamais linear e a linguagem com frases curtas, sincopadas, quando se encontram muitos anacolutos (desvio do plano de construção da frase) e às vezes um tipo de construção até mais ousado: “Por isso tinha deixado a porta aberta. Por onde.” Enfatizem-se também os finais abertos, procedimentos que enriquecem o texto.
Comentar nessa rápida abordagem, o último conto Jardim Europa, de quarenta páginas, portanto mais uma novela, no qual há múltiplas personagens e temática social moderna, é praticamente impossível. Ele difere de todos os outros; seria necessário muito mais espaço.
Ao terminar de ler uma obra de Menalton Braff, a primeira sensação que se tem é de admiração pela criatividade fecunda de sua produção literária e sempre de ótima qualidade. Segue-se depois o fato do seu grande conhecimento da língua portuguesa, o estilo muito pessoal. O Peso da Gravata só veio confirmar essas assertivas do laureado autor.
Ely Vieitez Lisboa
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