Minha Deusa Verde nasceu na entrada do meu Condomínio, às margens da Via Anhanguera. Alta, copada, magnífica. Quem a teria plantado? Fico imaginando quando a plantaram, miúda, mirradinha. Como imaginar a majestosa deusa em que se transformaria?! Copa arredondada, os longos braços flexíveis, balouçando ao vento, cobertos de folhas esmeraldinas, um tesouro.
Quando passo por ela, cumprimento-a com alegria e ela responde com sua verdura exuberante, presente de Deus. Sempre amei as árvores, grandes, pequenas, esguias, copadas, símbolos de vida. A Botânica deve explicar a força mágica que impulsiona as plantas, as árvores, para cima, para o alto, sinônimos de vida.
Há dias, quando passei pelo local, vi a movimentação das reformas. Nada me impressionou muito, deveria ser algo necessário. Alguns dias depois, no entanto, uma grande desgraça aconteceu e fui tomada por um tristeza inconsolável. Ao sair do Condomínio, rumo a Ribeirão Preto, deparei com a cena trágica: minha Deusa Verde, minha bela árvore amiga lá estava mutilada, sem seus galhos, só com a parte inferior do tronco! O quadro macabro pareceu-me algo dantesco de destruição; as pontas da galharia trucidada eram mãos magras erguidas para o alto, bradando contra o crime hediondo.
Com uma dor profunda, parei diante da cena, tentando entender. Que projeto infernal não conseguiu evitar a destruição daquela obra-de-arte de Deus, daquele símbolo de vida?! Seria realmente necessário seu sacrifício?
O dia cinzento pareceu protestar contra o ato bestial. Fiquei também cinzenta por dentro, tomada por uma revolta inútil, sem solução. O quadro era uma metáfora da vida, que às vezes nos rouba o essencial, nos dá uma lição da inexorabilidade de tudo que é vivo e belo.
À tarde, quando voltei de Ribeirão Preto, olhei pasma para o local de minha árvore, para me despedir de seus restos mortais. Incrédula, vi que nada mais havia ali. O terreno limpo estava totalmente vazio e aplainado! A terra lisa, nada denunciava a beleza ímpar da árvore que ali antes havia. Chão deserto. Terra morta.
Por alguns dias não consegui consolar meu coração daquela perda. Não quis saber quem foi o culpado do crime, ou se era algo necessário. A vida ficou mais pobre, mais feia. Aos poucos, ideias começaram a coriscar em minha mente. O sacrifício de minha árvore era uma dura lição, mensagem cruel para eu entender mais a possível lógica da vida. Tudo é falaz, passageiro. Nada fica para sempre, nada é eterno.
Também o fato de, após o crime, não ficar sinal algum, pegada ou vestígio de que ali havia antes algo vivo e belo, fremente, pleno de vida, é também uma dura lição realista. Nós somos seres quiméricos, efêmeros, passageiros e, muitas vezes, não deixamos lembranças após nossa partida para o outro plano.
Talvez, com esta perda (elas já foram tantas! Algumas mais trágicas, dolorosas...) resta a lição essencial, que nos dá mais um pouco de sabedoria (mas a que preço!): é preciso tentar, em vida, fazer uma semeadura farta e cuidadosa, para que, em nossa ausência, reste uma possível messe pródiga, para os que ficam.
Este talvez seja o único consolo diante da nossa fatal e inexorável transitoriedade.
Ely Vieitez Lisboa
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