Como ponto de partida, aceite-se o pressuposto de
que não existem regimes políticos perfeitos, a funcionar num qualquer espaço
terrestre, admitindo-se, todavia, poder haver regimes que, globalmente
considerados, satisfazem o maior número de cidadãos com os bens essenciais à
vida em sociedade e, tendencialmente, procuram cobrir todo o universo
populacional, onde estão a ser aplicados, sem que haja garantia que, num
futuro, mais ou menos próximo, todos beneficiem dos mesmos direitos, e cumpram
os mesmos deveres fundamentais. Entretanto, idealizam-se novas formas,
processos e técnicas de intervenção social, no sentido da construção de uma
sociedade mais justa, mais confortável e mais igualitária.
A Democracia não é um regime político totalmente
perfeito, acabado, justo e solidário, na medida em que as diferenças sociais,
económicas e cívicas, em muitos países, em vez de se esbaterem, têm vindo a
acentuar-se, provocando grande desconforto nas populações mais desfavorecidas e
mais desprotegidas.
Esta evidência comprova, facilmente, através das
estatísticas mundiais, que os cerca de dez por cento da população estão cada
vez mais ricos e os cerca de noventa por cento, cada vez mais pobres. A que se
fica a dever tal descalabro é uma questão que, raramente, se discute, e quando
o debate surge, entre classes médias e baixas, não é esclarecedor para que os
responsáveis políticos, os agentes económicos e outros intervenientes na
economia, assumam uma posição que contribua para alterar esta situação.
No regime democrático, aparentemente, as maiorias
governam, no respeito pelos direitos das minorias, e estas submetem-se,
responsavelmente, à função de vigiar, criticar e apresentar alternativas às
decisões de quem governa. O que acontece é que quem governa, alegadamente,
representa a maioria, porém, e em boa verdade, trata-se de uma minoria,
indubitavelmente, legal, legitimamente mandatada para legislar e governar,
contudo, nem sempre em benefício ou proporcionalmente à maioria que os elegeu,
e muito menos ao todo que é o universo populacional.
O conceito de Democracia, na sua versão mais
simples e extensa, aponta para o “governo
do povo, pelo povo, para o povo e com o povo” e ainda na perspetiva da
democracia direta, o que, atualmente, não se afigura exequível.
Na sua dimensão representativa, a democracia indireta
deveria ser o governo dos eleitos pelo povo, para o povo, no interesse do povo,
extensivamente a todos os cidadãos. Nesta democracia representativa, os
cidadãos devem ser considerados todos iguais no tratamento que os órgãos do
poder democrático lhes dispensam, designadamente, no acesso aos bens e serviços
que, precisamente, são suportados pelas contribuições de todos, enquanto do domínio
e responsabilidade do setor público e semipúblico ou intervencionado e apoiado
pelo governo, isto é, todos devem ser objeto do mesmo tratamento quando é o
Estado/Governo a utilizar os recursos provenientes dos contribuintes, o que
significa que o acesso à saúde, à educação, à segurança social, à ordem pública
e defesa da soberania, à justiça e ao bem-comum, deve ser igual para todos.
Usar a legitimidade do voto democrático, para
legislar e executar políticas que favorecem grupos, indivíduos ou situações, já
de si privilegiados, é trair a confiança que o eleitor depositou numa força
política, num indivíduo, num programa eleitoral, no momento em que exercia os
seus deveres e direito cívicos.
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente do
Núcleo de Letras e Artes de Portugal
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