Fragilidades do Estado Democrático- Diamantino Bártolo




Como ponto de partida, aceite-se o pressuposto de que não existem regimes políticos perfeitos, a funcionar num qualquer espaço terrestre, admitindo-se, todavia, poder haver regimes que, globalmente considerados, satisfazem o maior número de cidadãos com os bens essenciais à vida em sociedade e, tendencialmente, procuram cobrir todo o universo populacional, onde estão a ser aplicados, sem que haja garantia que, num futuro, mais ou menos próximo, todos beneficiem dos mesmos direitos, e cumpram os mesmos deveres fundamentais. Entretanto, idealizam-se novas formas, processos e técnicas de intervenção social, no sentido da construção de uma sociedade mais justa, mais confortável e mais igualitária.
A Democracia não é um regime político totalmente perfeito, acabado, justo e solidário, na medida em que as diferenças sociais, económicas e cívicas, em muitos países, em vez de se esbaterem, têm vindo a acentuar-se, provocando grande desconforto nas populações mais desfavorecidas e mais desprotegidas.
Esta evidência comprova, facilmente, através das estatísticas mundiais, que os cerca de dez por cento da população estão cada vez mais ricos e os cerca de noventa por cento, cada vez mais pobres. A que se fica a dever tal descalabro é uma questão que, raramente, se discute, e quando o debate surge, entre classes médias e baixas, não é esclarecedor para que os responsáveis políticos, os agentes económicos e outros intervenientes na economia, assumam uma posição que contribua para alterar esta situação.
No regime democrático, aparentemente, as maiorias governam, no respeito pelos direitos das minorias, e estas submetem-se, responsavelmente, à função de vigiar, criticar e apresentar alternativas às decisões de quem governa. O que acontece é que quem governa, alegadamente, representa a maioria, porém, e em boa verdade, trata-se de uma minoria, indubitavelmente, legal, legitimamente mandatada para legislar e governar, contudo, nem sempre em benefício ou proporcionalmente à maioria que os elegeu, e muito menos ao todo que é o universo populacional.
O conceito de Democracia, na sua versão mais simples e extensa, aponta para o “governo do povo, pelo povo, para o povo e com o povo” e ainda na perspetiva da democracia direta, o que, atualmente, não se afigura exequível.
Na sua dimensão representativa, a democracia indireta deveria ser o governo dos eleitos pelo povo, para o povo, no interesse do povo, extensivamente a todos os cidadãos. Nesta democracia representativa, os cidadãos devem ser considerados todos iguais no tratamento que os órgãos do poder democrático lhes dispensam, designadamente, no acesso aos bens e serviços que, precisamente, são suportados pelas contribuições de todos, enquanto do domínio e responsabilidade do setor público e semipúblico ou intervencionado e apoiado pelo governo, isto é, todos devem ser objeto do mesmo tratamento quando é o Estado/Governo a utilizar os recursos provenientes dos contribuintes, o que significa que o acesso à saúde, à educação, à segurança social, à ordem pública e defesa da soberania, à justiça e ao bem-comum, deve ser igual para todos.
Usar a legitimidade do voto democrático, para legislar e executar políticas que favorecem grupos, indivíduos ou situações, já de si privilegiados, é trair a confiança que o eleitor depositou numa força política, num indivíduo, num programa eleitoral, no momento em que exercia os seus deveres e direito cívicos.


Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

Presidente do Núcleo de Letras e Artes de Portugal







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