Um dia desses eu fugi para um mundo lírico, sem malas, mas com asas e aterrissei na Poesia. A culpa é do Manoel de Barros, que diz coisas encantadas em seu mundo, só dele. Sua linguagem, as metáforas, até os neologismos, tudo é passaporte para o mistério poético.
Por Deus, que homem é este?! Em que mundo vive? Eu já conhecia a obra Poesia Completa de Manoel de Barros, da Texto Editores Ltda., publicada em 2010. Eu já me encantara, até escrevi um texto sobre o alumbramento em que mergulhei, quando li seus poemas.
Eis que a amiga querida nos presenteou com o livro Compêndio para Uso dos Pássaros, da mesma Editora, também de 2010. Ali, nas orelhas, ele, MB, confessa: “ Quando era criança eu deveria pular muro do vizinho para catar goiaba. Mas não havia vizinho. Em vez de peraltagem eu fazia solidão”.
Lendo e relendo essa obra encantada, descobri entre os poemas, nas páginas 37 e 38, definições de Poesia, algo que muitos poetas já tentaram. Manoel de Barros diz, no poema Experimentando a Manhã Nos Galos: “... poesia é / __é como a boca / dos ventos / na harpa / nuvem / a comer na árvore/ vazia que/ desfolha noite / raiz entrando / em orvalhos.../ os silêncios sem poro / floresta que oculta / quem aparece / como quem fala / desaparece na boca/ cigarra que estoura o / crepúsculo / que a contém / o beijo dos rios / aberto nos campos / espalmando em álacres / os pássaros / __ e é livre / como um rumo / nem desconfiado”...
Li dezenas de vezes o poema, tentei adentrar na semântica daquela inusitada linguagem figurada e estranhamente, em cada leitura, ricos sentidos se apresentavam, como um lindo móbile, que mudava em cada olhar... Esse é um dos grandes mistérios da Poesia. Alguém já disse que, ao criar uma metáfora, o Autor e Deus sabem por que e como ela foi criada, seu sentido primeiro. Depois de algum tempo, só a Suprema Sapiência poderá decodificá-la...
Fiquei obsessiva. Queria outras definições de Poetas assinalados, esses seres que têm antenas especiais para captar o desconhecido mundo que nos rodeia. Mas por quem começar? Há tantos eleitos por Euterpe,a Musa da Poesia. Escolhi um critério. O grande Mário Quintana. Afinal, ele está entre os melhores e, em 2014, vai ser homenageado pela Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto.
Na Fortuna Crítica da obra Poesia Completa de Mário Quintana, (Editora Nova Aguilar, primeira edição, em 2005), vários nomes ilustres da Literatura Brasileira fazem depoimentos minuciosos, colocando nosso Poeta entre os mais importantes do Brasil.
Abro o livro ao acaso e, na página 197, encontro uma raridade poética, que me atrai como um ímã: “Um poema como um gole d’água bebido no escuro. / Como um pobre animal palpitando ferido. / Como pequenina moeda de prata perdida para sempre na floresta noturna. / Um poema sem outra angústia que a sua misteriosa condição de poema. / Triste./ Solitário./ Único. / Ferido de mortal beleza ”.
Fechei o livro, inquieta e frustrada. Desisti. Era procurar pedras preciosas em um tesouro imenso. Só me aquietou um pouco a alma, pensar que tentar definir Poesia é algo complexo e talvez muito individual. Aí, um Anjo Torto, que vive não nas sombras, como o do Drummond, mas na luz das possibilidades, me ciciou brandamente: “Sossega, minha amiga, porque há olhos que só veem a superfície das coisas. Outros tentam aprofundar na essência. Poucos possuem raios-x”. Agradeci a lição preciosa e fui cuidar da vida.
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