Li certa vez um artigo de Martha Medeiros e gostei muito. Era sobre a obsessão da juventude eterna, principalmente das mulheres. Menciona o episódio sobre idade (ela é jovem, de 1961) que me fez lembrar uma experiência minha, há uns vinte anos. Com sessenta anos, incomodava-me a mudança de década. Fazendo uma palestra, permiti-me reduzir um pouco a idade e comecei dizendo: “Com 55 anos, sei que...”. Um burburinho eletrizou a plateia. “Mulher corajosa! Confessa que já tem mais de cinquenta!”.
Ora, sempre apreciei os textos de Martha, jornalista, escritora e poetisa. Meu tio Ito, em Bagé, na divisa o Uruguai, fã ardoroso das crônicas que Martha publicava no jornal Zero Hora, de Porto Alegre, ele me mandava, semanalmente, seus textos. Depois li seu livro Divã, quando iniciou na ficção. Excelente romance meio autobiográfico. Em um outro artigo seu, ela tem uma frase antológica: “Quero ser jovem até os 120 anos”. A sentença exala sabedoria. Realmente, a mocidade vem de dentro, do interior para fora. Poder-se-ia dizer que ela é uma força centrífuga. Os incautos, os ingênuos ligam-na ao exterior, à aparência. Esquecem-se de que há pessoas que são velhas aos trinta anos e outras não envelhecem aos oitenta.
Certa vez, em um cabeleireiro, ouvi cinco mulheres com seus grandes sonhos. Todas queriam fazer plástica, corrigir a natureza, aumentar o busto, levantar o traseiro, sumir com as rugas da face, do pescoço, usar botox, diminuir olheiras, pálpebras caídas. Tive vontade de perguntar: E o cérebro? Que poderão fazer para estimulá-lo? Todavia continuei ouvindo em silêncio, analisando o parco conteúdo do grasnar daquelas pobres gralhas do supérfluo.
Ora, a estética, a cirurgia plástica é algo nobre que corrige, melhora, pode trazer felicidade. O perigoso é a obsessiva preocupação com a aparência, em detrimento do interior, da cultura, de filosofias que enaltecem os bons sentimentos, a generosidade. Muito já se falou sobre esse assunto e o vilão maior é o exacerbamento do valor à beleza física, laureada pela mídia, pela televisão. A inversão de valores incomoda, preocupa. Vive-se na busca do ter, do lucro, ao dinheiro, Moloch moderno que abastarda e mata. A ambição, o materialismo são venenos que, inoculados nos seres humanos, eles enveredam por ínvios caminhos sempre perigosos, muita vezes letais e sem volta.
Assim, o homem moderno (ou de sempre?) desde muito cedo deve tomar cuidado. O equilíbrio, o zelo, uma certa sabedoria no viver, que é sempre mata cerrada, sem picadas ou sinais claros. Segurança, sem descambar para o traumático medo de agir, ousadia regrada, idealismo alicerçado em bases firmes. Analisar o ontem, agir no hoje, com olhos no amanhã. Tudo passa em um átimo. Dizer que a vida é efêmera não é uma metáfora, mas pura realidade.
Voltemos à tese inicial. Malba Tahan, heterônimo famoso do escritor Júlio César de Melo e Sousa (Rio de Janeiro, 1895-Recife, 1974) tem um texto notável sobre a mocidade, afirmando que ela reside “em certas energias do espírito, em limitadas qualidades da imaginação, no vigor de certas emoções e no frescor das fontes sobrenaturais em que o indivíduo vai saciar as alegrias sãs da vida”.
A inteligente escritora Martha Medeiros defende a tese que ser jovem, rejuvenescer é ter a capacidade de enfrentar situações novas. Boa filosofia. Eu diria mais. Aquele que não ousa mudar e deixa o acomodamento tomar conta de si, chafurdando na areia movediça do medo e do tédio, envelheceu, mumificou, virou doente terminal na UTI da vida. Não há médico nem terapêutica que o tire do coma da existência.
Ely Vieitez Lisboa
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