Vivenciar, com a dignidade que enobrece a pessoa
humana, um período tão especial como este que agora se atravessa,
correspondente à quadra Natalícia, é a renovação de um acontecimento que, ano
após ano, se repete e que culmina em dois dias de profundo significado para as
famílias: o dia de Ceia de Natal e o dia de Natal. Cada um com o seu
simbolismo, intenso, emocional e místico, porque a sensibilidade para os
valores da família fica mais exposta, mais sensível e também mais vulnerável.
A vida humana é curta, demasiado rápida, para que
se perca tempo com atividades, comportamentos, interesses e situações, que
apenas revelam grande falta de sensibilidade e de boas-práticas, no exercício
dos valores fundamentais da dignidade da pessoa, que se deseja verdadeiramente
humana.
Com efeito: «Viemos
cá para estarmos em comunhão, para aprendermos sobre o amor com outros seres
humanos que estão no mesmo caminho que nós, que aprendem as mesmas lições. O
amor não é um processo intelectual. É sim uma energia dinâmica que entra em nós
e flui todo o tempo através de nós, estejamos nós conscientes desse facto ou
não. O fundamental é aprendermos a receber amor, assim como a dá-lo. Só podemos
compreender a energia envolvente do amor na comunhão com os outros, nas relações,
no serviço» (BRIAN, 2000:64).
O aproveitamento deste período, para dissimular
sentimentos mesquinhos, cínicos e impostores, trocando-os, hipocritamente,
durante alguns dias, por aqueles que se deveriam sentir, manifestar e praticar,
ao longo do ano inteiro, de todos os anos, alegadamente para se “levar a vida”, constitui uma atitude
inaceitável e mesmo reprovável, imprópria da superior dimensão de todo o ser
humano.
O período natalício deveria compor-se por trezentos
e sessenta e cinco dias, todos os anos, e, na vivência de cada um deles, o
Natal será sempre um dia diferente, renovado, melhorado, que conduza à
interiorização e prática de sentimentos puros, do bem, que não se compram, não
se negoceiam por qualquer forma, simplesmente se retribuem com a mesma nobreza,
desde logo, com amor.
Este fortíssimo e insubstituível sentimento, no
pressuposto de verdadeiro, incondicional e diariamente reiterado, vencerá todas
as barreiras e transportará a humanidade à vitória final: Saúde, Trabalho,
Amizade, amor, Paz, Felicidade e a Proteção Divina
Em cada Natal sempre se promete a reconciliação
para, decorridos poucos dias, tudo voltar à mesma situação, e poucas serão as
pessoas que realmente mudam de atitude. É certo que o ser humano é fraco, defeituoso
e instável, todavia, também é verdade que a força espiritual da pessoa,
igualmente vence barreiras, por mais difíceis que elas se apresentem.
Mas o Natal é, igualmente, um dia especial,
principalmente quando utilizado na reflexão profunda sobre o passado vivido, o
presente fugaz e um futuro que se deseja de dignidade e consolidação dos
valores mais nobres de toda a pessoa humana, bem formada: «O verdadeiro homem de bem é aquele que pratica a lei de justiça, de
amor e de caridade, na sua maior pureza. Se ele interroga sua consciência sobre
seus próprios atos, pergunta se não violou essa lei, se não praticou o mal, se
fez todo o bem que podia (…), se fez aos outros tudo o que desejava que os
outros fizessem por ele (…). Tem fé em Deus, em sua bondade, em sua justiça e
em sua sabedoria (…). Tem fé no futuro; por isso coloca os bens espirituais
acima dos bens temporais.» (KARDEC, 2010:332).
Assumir o Natal como o primeiro dia do resto da
vida, é uma atitude inicial, que, a partir de agora, deve preocupar toda a
pessoa: um primordial dia de solidariedade para com aqueles que são vítimas de
alguma injustiça ou situação; um primeiro dia de amizade, desde já numa
dimensão de verdadeiro e sincero “Amor-de-Amigo”, onde cada um dos amigos é parte
integrante do outro amigo: nas alegrias como nas tristezas; no sucesso como no
fracasso; afinal, como duas almas gémeas que se amam; um primeiro dia para o
início de uma lealdade sem limites, à prova de qualquer tentação de destruição
ou de traição; um primeiro dia de manifestação de gratidão, por tudo quanto nos
tem sido oferecido, com sinceridade e amizade; um primeiro dia para a
reconciliação de pessoas em geral, dos amigos em particular.
Este tempo festivo, que secularmente se designa por
“Quadra Natalícia” deverá ser aproveitado para: se fazer um balanço de
relacionamentos passados; analisar onde é que se cometeram erros, e porquê; em
que circunstâncias se praticaram injustiças, incorreções e ingratidões, para
com aquelas pessoas que sempre estiveram do nosso lado que, incondicionalmente,
gostam de nós, nos apoiam em tudo o que lhes é possível, que connosco se
solidarizam quando somos humilhados e injustiçados. Pessoas que são como um “Porto Seguro”.
Este é o tempo: de fazermos justiça; de nos
reconciliarmos com aqueles que, injustamente, maltratamos, que ostensivamente
desprezamos; que, mais ou menos sub-repticiamente, lhes mostramos e, contra
eles praticamos a indiferença, mesmo sabendo e recebendo carinho, respeito,
consideração e até um sincero “Amor-de-Amigo”. Em boa verdade, este é o tempo
de nos arrependermos, de pedirmos perdão àqueles que ofendemos e nos quais
provocamos grandes sofrimentos e desgostos.
A dimensão sentimental da pessoa, verdadeiramente
humana é, porventura, uma das suas maiores riquezas. O valor do sentimento
nobre e puro, que engrandece e respeita, não só quem o possui, mas também quem
o recebe, é o fundamento para quem, sinceramente se gosta. O sentimento da
amizade é uma dimensão humana que, realmente, poderá ser difícil para quem vive
num mundo de aparências, de fingimento, de falsidade, do faz-de-conta.
Os sentimentos verdadeiros, puros, incondicionais,
certamente que provocam alegrias e tristezas, dor, sofrimento, desgostos, mas
também muita felicidade quando vividos com: solidariedade, amizade, lealdade,
reciprocidade, estima, carinho, gratidão, humildade e respeito, até porque: «A conexão entre duas pessoas só é
plenamente exercida quando a intimidade é vivida pela expressão clara dos
sentimentos (…). Como Jesus previu, é preciso pureza de coração para construir
um relacionamento feliz.» (BAKER, 2001:130).
Esta caraterística inimitável e infalsificável, que
existe em todos os seres humanos, ou seja, os sentimentos, constitui o núcleo
mais intenso que, de alguma forma, comanda a vida. Claro que as emoções
envolvem, com maior ou menor intensidade, perturbações, reações, conflitos e
decisões. No sentimento do amor, inclusive ao nível do “Amor-de-Amigo”, ele será tanto mais genuíno, quanto é acompanhado
por um outro que não sendo doentio, é a prova da pureza daquele.
Na verdade: «O
ciúme é um sentimento inato com um papel importantíssimo na preservação das
relações amorosas e do qual ninguém escapa. Mas o ciúme tem muitas formas e
pode até ser um elemento de felicidade, na vida do casal.» (TORRALBA,
2010-orelha da contracapa)
Natal é tempo para tudo de bom que se deseja fazer.
É tempo para refletir sobre o passado, tentar descobrir as razões porque
correram mal certos projetos, porque se chegou a determinadas situações. É
tempo para reparar, para reconstruir, para agradecer, para perdoar, para
retomar um novo caminho, lutar por uma nova esperança, de contrário: «Quando nos apegamos às nossas opiniões com
agressividade, por mais válida que seja a nossa causa, estamos pura e
simplesmente a acrescentar mais agressividade ao planeta, e a violência e a dor
aumentam. Cultivar a não-agressão é cultivar a paz.» (CHODRON, 1997:141).
Este é o tempo de se criar uma paz genuína: entre
as pessoas, famílias, vizinhos, comunidades, povos e nações. Hoje, mais do que
nunca, face às inúmeras e, possivelmente prolongadas dificuldades, de natureza
económica, política, social, religiosa e axiológica, é indispensável assumir a
paz como um desígnio universal.
Na verdade: «A verdadeira paz é sempre possível. No
entanto requer força e prática, particularmente em tempo de grandes
dificuldades. Para alguns a paz e a não-violência são sinónimos de passividade
e de fraqueza. Na verdade, praticar a paz e a não-violência estão longe de ser
uma atitude passiva. Praticar a paz, fazer a paz viver dentro de nós, é
cultivar ativamente a compreensão, o amor e a compaixão, mesmo em situações de
confusão e conflito.» (HANH, 2004:8).
Tempo de Natal e da família, no contexto da reunião
à volta da mesa da Ceia da Consoada. Dia do nascimento de Jesus Cristo, segundo
algumas doutrinas. Dia de alegria para umas pessoas, pelo convívio, pela
reaproximação; mas também de tristeza e de saudade para aquelas que perderam ou
estão longe dos seus entes queridos, que tanto amam.
Dia para amigos desencontrados se compatibilizarem,
se amarem como já se amaram no passado, num sincero e inigualável “Amor-de-Amigo”. Dia para se perdoar os
erros e se mostrar solidariedade, amizade, lealdade, reciprocidade, confiança,
estima, carinho, respeito e comunhão de valores, sentimentos e objetivos
comuns. Dia para recuperar alguma felicidade perdida. Dia para fazer as pazes
entre amigos que tanto se gostavam e que por influências ou medos se afastaram.
Neste dia de Natal, tão especial para a esmagadora
maioria das pessoas, a mensagem que se deseja transmitir, vai no sentido da
renovação da Esperança, em todas as suas dimensões: Esperança na solidariedade
entre nações, povos, famílias e amigos; Esperança na (re) conquista e
consolidação da amizade; Esperança nas boas-práticas dos valores da
solidariedade, da amizade, da lealdade, da humildade, da gratidão, da cumplicidade
e da reciprocidade.
Igualmente: Esperança na melhoria das condições de
vida para todas as pessoas, onde o trabalho digno, reconhecido, valorizado e
estável, garanta um futuro de qualidade; Esperança num mundo de paz, no qual a
felicidade seja o denominador comum a todas as pessoas, famílias, povos e
nações; Esperança na consolidação da dignidade devida a toda a pessoa humana;
Esperança numa nova Esperança de vida; finalmente, Esperança na proteção Divina,
para que Deus nunca deixe de amparar a humanidade. Estes são os desejos,
totalmente sinceros, do autor desta breve reflexão, que os propaga a todas as
pessoas, sem exceções.
Um
Natal com verdade, com lealdade, com reciprocidade, com gratidão, seja no seio
da família, seja com outras pessoas, com aquela amizade de um sincero «Amor-de-Amigo», com um sentimento de
tolerância, de perdão e muito reconhecimento para com todas as pessoas que, ao
longo da minha vida, me têm ajudado, compreendendo-me e nunca me abandonando. É
este Natal que eu desejo festejar com muita alegria.
Feliz Natal. Bom Ano Novo.
Bibliografia
BAKER, Mark W., (2005). Jesus o Maior Psicólogo que já
Existiu. Tradução, Cláudia Gerpe Duarte. Rio de Janeiro: Sextante.
BRIAN L. Weiss, M.D. (2000). A Divina Sabedoria dos Mestres.
Um Guia para a Felicidade, alegria e Paz Interior. Tradução, António Reca de
Sousa. Cascais: Pergaminho.
CHODRON, Pema, (2007).
Quando Tudo se Desfaz. Palavras de coragem para tempos difíceis. Tradução,
Maria Augusta Júdice. Porto: ASA editores.
HANH, Thich Nhat, (2004). Criar a Verdadeira Paz.
Cascais : Pergaminho
KARDEC, Allan, (2010). O Evangelho Segundo o Espiritismo: contendo a
explicação das máximas morais do Cristo, sua concordância com o Espiritismo e
sua aplicação nas diversas situações da vida. Tradução, de Albertina Escudeiro
Sêco. 4ª Edição. Algés/Portugal: Verdade e Luz – Editora e Distribuidora Espírita.
TORRABLDA, Francesc, (2010). A Arte de Saber Escutar. Tradução, António
Manuel Venda. Lisboa: Guerra e Paz, Editores S.A., in: MARAZZSITI, Donatella.
“E viveram felizes e Ciumentos para Sempre”, Donatella. “E viveram felizes e
Ciumentos para Sempre”
Com o protesto da minha perene GRATIDÃO
Diamantino Lourenço Rodrigues de
Bártolo
Presidente do Núcleo Académico de
Letras e Artes de Portugal
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