Os Caminhos do Norte e a gastronomia *
Podemos dizer que os Caminhos de Santiago começam e seguem onde e por onde o peregrino quiser, podendo variar ao sabor da vontade própria ou à dos interesses económicos dos sítios por onde passam.
Dos Caminhos de Santiago clássicos, há cinco que cruzam o Norte de Portugal se não contarmos com os pequenos caminhos secundários, como por exemplo o que passa em Pitões da Júnias, e que hoje estão praticamente desactivadas como tal.
Três desses cinco caminhos, são interiores;
A Via da Prata, que de Bragança atravessa Trás-os-Monte e vai até Chaves. De notar que a entrada em Portugal se faz por Quintanilha, a Porta Xacobea mais antiga de Portugal.
O Caminho Interior, que de Viseu também vai até Chaves, saindo, como o que vem de Bragança, em direcção a Verin.
(Uma pequena nota;
Não se admirem que fale em Viseu, mesmo que de raspão. O meu entendimento de Norte, pelo menos neste aspecto, vai até Viseu, como vai até Aveiro ou mesmo à Mealhada ou a Coimbra, assumindo eu, sem qualquer tipo de desprimor, que sendo o Centro uma região de transição, só nos serve, pelo menos neste aspecto, repito, para separar o Norte do Sul. É para mim evidente que a divisão em províncias é a única divisão verdadeira. Temos tantas particularidades, que só esta nos consegue definir correctamente.)
Mas, continuemos;
O terceiro destes três caminhos, é o Caminho da Geira que da Caniçada atravessa o Parque Nacional de Peneda Gerês e sai pela Portela do Homem, entroncado depois, como os dois anteriores, no Caminho da Prata Espanhol.
E, para completar os cinco caminhos de que vos falei, há ainda os que do Porto seguem até Valença.
Destes, o da Costa e o do Norte, o primeiro começa junto ao farol de São Miguel-o-Anjo, sendo que o do Norte é um prolongamento do Caminho Central, e começa na Sé do Porto.
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Tem havido, nestes últimos anos, um enorme aumento de turistas, nacionais e estrangeiros. São aos milhares os que percorrem o Norte de Portugal por estes caminhos.
Os caminheiros levam dias e dias a percorrer os muitos e muitos quilómetros de cada um destes caminhos até chegarem a Santiago de Compostela. Mochila às costas pernoitam em Albergues, sempre com o desafio de cumprir a caminhada.
Com o aumento de gente vem inevitavelmente um incremento económico. Os serviços melhoram e as empresas, novas e antigas tendem a florescer. Um dos sectores que mais terá beneficiado com este aumento, é o da restauração. Afinal, os peregrinos têm de comer. E, admitamos, gostam de comer. E gostarão de comer bem. E, acima de tudo, comer o que na terra deles não têm. E as refeições são feitas pelo caminho.
Nos dias de hoje, o Caminho de Santiago terá deixado de ser essencialmente um trajecto de peregrinação a Santiago de Compostela, motivado quase exclusivamente pela fé, para passar a ser também, com a atenção dispensada aos elementos que vão distraindo o peregrino ao longo de percurso, uma via de Turismo Cultural, Religioso e de Espiritualidade, com a visita a sítios históricos, artísticos e, especialmente, sagrados, como santuários, conventos, mosteiros, igrejas, ermidas, capelas, catedrais, etc., captando sempre que possível o espírito dos lugares por onde passam.
Em 1987, o Caminho de Santiago foi declarado, pelo Conselho da Europa, como Primeiro Itinerário Cultural da Europa.
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Ora, a gastronomia insere-se perfeitamente na vertente cultural deste tipo de turismo.
Por estes caminhos muitos são os pitéus típicos que qualquer viajante/caminheiro/peregrino encontra e pode calmamente degustar.
O objectivo, como já referi, já não é só chegar à Catedral de Santiago de Compostela. Pelo caminho escolhido há muitas e muitas coisas para ver e muitas e muitas coisas para comer e para beber.
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Seria fastidioso falar de todos os pratos e suas variantes que podemos encontrar no Norte do nosso País, tão rico que ele é, também, no que diz respeito à gastronomia.
No Litoral vamos encontrando uma miríade de peixes e de mariscos, a sopa de peixe e o caldo verde, a caldeirada de peixe e o polvo, a que se juntam na época própria os ciclóstomos arranjados de várias e apetitosas maneiras.
Mais para o interior começam a aparecer com mais assiduidade, como pratos típicos e regionais, as carnes. Primeiro as de porco e os frangos e galinhas, depois, ainda mais para o interior, as ovelhas, vacas, bezerros e bois, e a caça, como o coelho-bravo, o javali ou o veado. E sempre o bacalhau e o polvo, e a famosa feijoada à transmontana.
Um festival de cheiros e sabores, um banquete para os sentidos, reais pecados confessáveis.
Nos começos, as entradas, os azeites, as azeitonas, o presunto, o pão.
Nos entremeios os maravilhosos enchidos.
Em todos os momentos os vinhos de perder a cabeça. Uns como aperitivo, outros para acompanhar os peixes, outros para acompanhar as carnes.
Nos finalmentes os doces, os licores, os brandies, os Portos e as bagaceiras.
Vou referir só alguns, específicos de várias localidades, de entre a enorme variedade de pratos e entradas que o Norte do País tem, para vos aguçar o apetite, embora, como é evidente, dada a hora a que vos falo, logo após um maravilhoso repasto, falar de muitas e outras comidas quase possa ser motivo para um enjoo indesejado.
Assim, apelando à vossa paciência e boa-vontade, falemos de boa comida:
Chanfanas e cabrilheiras de Viseu e Cabrito assado de Lamego (por causa do que disse àcerca do tamanho do Norte), Covilhetes e Tripas aos Molhos de Vila Real, Pasteis de Chaves e Chouriças de Sangue de Chaves, Posta de vitela à Mirandesa de Bragança – Se falarmos só de uma pequeníssima parte do que poderemos encontrar no Caminho do Interior e no Caminho da Prata Transmontano.
Mas, já agora continuemos:
Nos caminhos do Norte e da Costa, encontramos Bacalhau à Gomes de Sá, Francesinhas, Tripas à moda do Porto e Amêijoas à Bulhão Pato, no Porto, Pescada à Poveira na Póvoa de Varzim, Galinha estufada em São Pedro de Rates (aqui mesmo nesta linda terra que nos recebe).
Desfiemos mais alguns pitéus:
Polvo da Pedra em Esposende, Arroz de Pato de Braga, Arroz de lampreia em Viana do Castelo, Rojões à moda do Minho e Papas de Sarrabulho em Barcelos, Arroz de Sarrabulho em Ponte de Lima, e em consonância com o que afirmei antes, o leitão da Bairrada, do Caminho Central. Eu sei lá, só de ler o que escrevi já estou com água na boca e, de novo, com uma larica de todo o tamanho, parecendo necessitar urgentemente de um digestivo.
E os vinhos, para acompanhar tão maravilhosas iguarias?
É difícil a escolha. Os vinhos Portugueses têm vindo, ano após ano, a subir de qualidade.
Vinhos – (Douro) (Alto Douro) (Planalto Transmontano) (Dão e Bairrada– ainda em nome da coerência), (Verdes – que no mundo só existem no Extremo Noroeste de Portugal). Brancos – Loureiro, Muralhas, Alvarinho, Tintos – Ponte de Lima e Sub-região de Amarante, de que destaco o Pascoais), cada qual com as suas características, mas todos igualmente excelentes.
E os doces? Os maravilhosos doces que são a perdição da maioria.
Ovos moles (Aveiro, para continuar a ser coerente) Papos de anjo, toucinho do céu, pudim de castanha, doce da Teixeira, bolo de laranja, bolo de chocolate, pudim abade priscos, clarinhas de Fão, charutos de ovos, lérias, cavacas, queijadas e um sem parar de outros doces.
Tudo de comer e chorar por mais.
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