O HOMEM BARROSÃO- Custódio Montes



 Nascidos nestes montes ao luar
Em chão agreste e tosco e sem semente
De duro e ruim pão para amassar
Arrostando marés que rudemente
Nos dobram o sofrer e o penar
Com lágrimas, suor em toda a gente
Carros de bois chiando nas encostas
Com cargas e mais cargas sobrepostas

A rudeza sofrida mas também
A mão gentil que afaga e acarinha
O colo acrisolado duma mãe
Como em nenhuma parte alguém a tinha
A perdurar na vida e no além
E que tudo nos diz, como adivinha,
A caminho da terra prometida
Atrás de serranias escondida

A perseguir a sombra atrás do arado
Em penedias donde brota o pão
Que feitas chão aberto e chão sagrado
Amamos com a vista e o coração
Ao nascer, no presente e no passado
Com carinho, amor e emoção:
Mesmo deixada em busca doutra sorte
É nossa para a vida e para a morte

 Pastores de pequenos como gente
Que a vida é difícil de ganhar
Cada um a ser forte e ser valente
Como os mais a fazer o seu lugar
Quer faça sol ou chova duramente
Com calor inclemente ou a nevar:
Os pais com a mão firme em chão lavrado
Os filhos, que não podem, guardam gado

De força indomável como os montes
Transformam em maninho o seu torrão
Sempre a pensarem noutros horizontes
Que não seja somente um ganha pão.
Querem novas fronteiras, novas pontes
Para poder sair da servidão:
Engendram outros rumos, outros trilhos
Para dar outra vida aos seus filhos

Foram nossos avós e nossos pais
Escravos e heróis a perdurar
Que nos fizeram padres, liceais
Nos incutiram gosto de estudar
Nos fizeram doutores como os mais
Engenheiros, juízes de mandar
Médicos, dirigentes, professores
Nesta terra há até descobridores

 Era um mundo de heróis e de gigantes
Mas ficaram sem vales e sem nada
Pegaram no cajado de emigrantes
Deixando a sua terra abandonada
E em lutas e canseiras navegantes
De vida novamente começada
A povos longínquos aportaram
E muitos para sempre lá ficaram

 E a tristeza deste mundo tão fechado
Abriu-se e caminhou nessas paragens
Choravam os que cá tinham deixado
E os da terra lembravam as imagens
Que no seu coração tinham gravado
E com elas voavam em miragens
Para manterem firme a esperança
De os manter consigo na lembrança

Agora há silvedos, matagais
Há terras de pousio sem sementes
Empregos são tão poucos e banais
E há velhos cansados e doentes
Depois de trabalharem de rurais
Em condições bravias, inclementes
E a primavera foi e é outono
Casas e campos sós ao abandono

Agora a esperança vem de novo
Com propaganda ao sol e à natureza
E mostrando a grandeza deste povo
A carne que consome a realeza
As feiras e as bruxas e o renovo
Os produtos que nascem na pureza
E tudo o mais que temos em Barroso
Que voltará a ser nobre e famoso


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