Ó meu querido passarinho
Lá no alto pipilando!
Sob ti passa um velhinho
Com toda a vida pesando.
Só as dores lhe dão sustento,
Só as tristezas o alento
Para melhor se arrastar.
E tu aí a cantar…
Que sabes tu deste mundo,
Que sabes tu, amiguinho?
Inda agora, um camião
Naquela rua a passar,
Não passou de uma ilusão…
Investiu na multidão,
Explodiu ódio pelo chão,
Nuvens de sangue no ar!
Tudo isto num segundo…
Que sabes tu, passarinho,
Que sabes tu deste mundo?
Há pouco, na paz serena
Da alma que a si procura,
Havia gente pequena
No coração recolhida
Em oração de candura,
Como em recanto de ermida.
Outros mais amargurados,
Exacerbando em pecados,
Intentavam melhorar
Teimando não reiterar.
Mas, eis que invade a ermida
O desrespeito pela vida!
As preces são já terror.
Nos sons de tiros, a dor.
E tu, passarinho? No ninho?
Voa daí passarinho!
Mas… Olha! Não voes, não…
Antes te peço, amiguinho:
Pega-me bem de mansinho,
Leva-me, devagarinho,
Num voo por qualquer lado
Menos amaldiçoado
Que este mundo tresloucado
E canta-me uma canção!
Pois, tu aí, passarinho,
És o que resta à inocência…
E o teu ninho tem ciência
Maior que o mundo inteirinho!
Pois, tu não crês, passarinho?!
Falta-te a fé? Paciência…
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