A Grande Esfinge do Egito- Fernando Pessoa

 A Grande Esfinge do Egito sonha por este papel dentro... 
Escrevo — e ela aparece-me através da minha mão transparente 
E ao canto do papel erguem-se as pirâmides... 
Escrevo — perturbo-me de ver o bico da minha pena 
Ser o perfil do rei Quéops ... 
De repente paro... 
Escureceu tudo... Caio por um abismo feito de tempo... 
Estou soterrado sob as pirâmides a escrever versos à luz clara deste 
candeeiro 
E todo o Egito me esmaga de alto através dos traços que faço com a 
pena... 
Ouço a Esfinge rir por dentro 
O som da minha pena a correr no papel... 
Atravessa o eu não poder vê-la uma mão enorme, 
Varre tudo para o canto do teto que fica por detrás de mim, 
E sobre o papel onde escrevo, entre ele e a pena que escreve 
Jaz o cadáver do rei Quéops, olhando-me com olhos muito abertos, 
E entre os nossos olhares que se cruzam corre o Nilo 
E uma alegria de barcos embandeirados erra 
Numa diagonal difusa 
Entre mim e o que eu penso... 
Funerais do rei Quéops em ouro velho e Mim! ...





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