A poesia do Outono- António Nobre

Noitinha. O sol, qual brigue em chamas, morre
Nos longes d'água... Ó tardes de novena!
Tardes de sonho em que a poesia escorre
E os bardos, a sonhar, molham a pena!

Ao longe, os rios de águas prateadas
Por entre os verdes canavias  esguios,
São como estradas liquidas, e as estradas
Ao luar, parecem verdadeiros rios!

Os choupos nus, tremendo, arrepiadinhos,
O chaile pedem a quem vai passando...
E nos seus leitos nupciais, os ninhos,
As lavandiscas noivam piando, piando!

O orvalho cai do céu, como um unguento.
Abrem as bocas, aparando-o, os goivos...
E a laranjeira, aos repelões do vento,
Deixa cair por terra a flor dos noivos.

E o orvalho cai... E, à falta d'agua, rega
O val sem fruto, a terra árida e nua!
E o Padre-Oceano, lá de longe, prega
O seu Sermão de Lagrimas, à Lua!

Tardes de Outono! Ó tardes de novena!
Outubro! Mez de Maio, na lareira!
Tardes...
Lá vem a Lua, graça plena,
Do convento dos céus, a eterna freira!

António Nobre
Ficheiro:Antonio Nobre.jpg
(1867-1900)


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