Indefinida- Natércia Freire



Oh, Poesia de andar
suspensa sobre outeiros!
Poesia de correr
Fundida nos ribeiros...
Oh, Poesia de ti,
que em mim estás a viver!
Oh, Poesia de então,
nos jardins, sob o Inverno,
pés na lama do chão,
e o dia, um dia eterno
de Poesia, a morrer!...

Poesia dos murmúrios,
dos nevoeiros densos,
dos silêncios sem luz,
dos pecados imensos,
sem gestos, qual a morte,
qual a ausência, sem vida.
Poesia de fechar
os olhos alagados
da Poesia de ti,
dos teus olhos fechados;
Poesia de ser virgem
e casta e indefinida...

Poesia, dos passeios
por entre a claridade,
entre árvores tão esguias
que tocavam os Céus,
e as folhas a cair
de um oiro sem idade...
Poesia fabulosa,
de uma riqueza enorme...
Uma Poesia fina,
alada, misteriosa;
Poesia de um passado
que em mim nunca mais dorme!

Poesia perturbada,
Poesia abandonada.
Poesia na prisão,
sufocada, esquecida,   
Poesia recalcada,
Poesia maltratada.
Ai, Poesia troçada
da jovem bem-casada
na poesia da vida!...

Ai, dias sem desígnio!
Ai, noites de mistério!
Poesia de ser virgem
e casta e indefinida!...

(Em: “Anel de Sete Pedras”)



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