Há quem lhe chame a “Festa da Família”. Concordemos com essa designação, mas também lhe
poderemos acrescentar a “Reconciliação”,
porque na verdade é nesta quadra festiva que muitas famílias, amigos e outras pessoas
desavindas, ou pelo menos, com relações menos boas, que poderão ter uma
oportunidade para se apaziguarem, e tentarem minimizar as consequências
entretanto ocorridas por força dos desentendimentos e outras questões
melindrosas.
O Natal não pode ser apenas um tempo de “consumo”,
muito embora, o comportamento gastador, para quem pode, seja uma forma de
satisfazer alguns desejos que, durante o ano, pretendia ver realizados,
aguardando-se, então, para esta quadra do ano, a concretização dos anseios,
mais ou menos prementes.
Certamente que muitas pessoas constroem as suas
críticas, precisamente, por se verificar este excesso consumista, em alguns
casos, com bens e serviços que até nem serão de primeira necessidade, mas: se
se trata de concretizar um “sonho”; realizar uma ambição, há muito desejada; e
se as pessoas têm condições financeiras para assim procederem, não há que
julgar, negativamente, quem quer que seja.
O Natal também é uma festa de dádiva, a começar
pelas crianças que, com alegria e ansiedade, aguardam aquela noite mágica para
abrirem os seus presentes, justamente ao lado da árvore natalícia e do presépio
onde se encontram as principais figuras deste evento: Jesus, Maria e José, Reis
Magos a caminho, e todo um conjunto de outros “intervenientes” alegóricos como:
os pastores, os animais, as oferendas, enfim a própria natureza vegetal coberta
de neve.
Trata-se de um enquadramento fascinante, que as
crianças, e não só, valorizam profundamente, que vivem aqueles momentos com uma
alegria indisfarçável, a Felicidade estampada nos olhinhos, naquelas faces
belíssimas, sim, porque toda a criança é bela em toda a sua inocência, grandeza
e dignidade.
Mas neste Natal, de 2017, de resto como em todos os
natais, deveríamos parar um pouco para pensar, desde logo no que fizemos de
errado ao longo do ano, nas pessoas que, intencional e insensatamente, ofendemos,
magoamos, apenas para satisfazermos egoísmos pessoais, alimentar uma certa
vaidade de ostensivo poder, ou promover alguma mesquinha vingança.
A Reconciliação será, portanto, uma outra dimensão
do Natal. Evidentemente que é necessário que as pessoas tenham a humildade e a generosidade
suficientes para se perdoarem entre si (o que não significa, esquecer), sim,
porque todos nos ofendemos reciprocamente, seja: pela afronta premeditada; pela
humilhação intencionada; pela rejeição propositada; pela imposição da mágoa,
dor e sofrimento, ou por quaisquer outros princípios, valores e sentimentos,
entretanto violados.
A Reconciliação é uma atitude que as pessoas bem formadas,
compreensivas e tolerantes, acabam por assumir, porque só assim poderemos
alcançar alguma paz interior. Não se está aqui a aplaudir quem nos ofende,
muito menos que tenhamos de aceitar tudo o que nos fazem, com o objetivo de nos
magoar, ofender, prejudicar e achincalhar, e ficarmos impávidos e serenos.
O adágio popular, segundo o qual: “Quem não se sente não é filho de boa gente”,
apesar de talvez um pouco “fora-de-moda” terá, em certas circunstâncias, a sua
lógica própria e poderá, inclusivamente, revelar o autêntico caráter da pessoa
que não reage às ofensas que recebe de outrem.
A sociedade atual atravessa tempos muito difíceis, é
verdade. O valor TER sobrepõe-se, quase sempre, à circunstância do SER. É claro
que é legítimo, a toda a pessoa, lutar por “Ter”: ter saúde, ter trabalho, ter
amor, ter Felicidade, ter bens materiais, ter a Graça e Proteção de Deus, ter
tudo o que lhe faz falta na vida, para desfrutar de uma existência
verdadeiramente digna da pessoa de deveres e direitos.
É da condição humana possuir o que lhe é necessário:
para que o conforto nunca lhe falte; para que o seu estatuto socioprofissional
seja o melhor possível; para que a vida não seja nenhum “calvário” de dor,
sofrimento e miséria. A redistribuição das riquezas naturais deveria, também,
ser uma realidade, naturalmente segundo critérios justos, com base no mérito de
cada pessoa.
Neste Natal, que é o nosso presente, outros já fazem
parte do passado e, quanto ao futuro, no que a esta festividade respeita, ainda
não chegou, então, por enquanto, pensemos na família como: “baluarte” de
valores altruístas; núcleo fundador de uma sociedade mais justa, mais
equilibrada, mais tolerante e mais estimada.
Toda a gente, em geral, deseja uma festa natalícia
com solenidade, esta no seu sentido mais grandioso e digno, onde a
solidariedade, a amizade, a lealdade, a gratidão e tantos outros valores,
genuinamente humanos, nos fortalecem, nos enobrecem e nos elevam acima de toda
a natureza que connosco convive neste planeta. Reconheçamos que somos seres
superiores, neste mundo terreno.
Viver intensa, e caritativamente, o Natal é uma
outra dimensão que não deve ser descurada, através da qual teremos de olhar e
solidarizarmo-nos com o “Outro”,
nosso semelhante, apoiá-lo de acordo com as nossas possibilidades,
transmitir-lhe um pouco de alegria que, provavelmente, não terá tido ao longo
do ano.
O Natal que desejamos para nós, pode ser,
igualmente, pretendido para os nossos irmãos na Fé, no Amor, na Amizade e nos
Sentimentos mais nobres. É crucial que se faça um “esforço”, que se pratique um
ato de generosidade, no sentido de promovermos a aproximação daqueles que,
apesar de nos terem ofendido, humilhado e magoado, ao longo do ano, ainda
alimentam a esperança de recuperarem amigos, entre os quais, nós poderemos ser
um deles.
Reconciliação é, inevitavelmente, a “prenda” que “embrulhará” o que de mais profundo
deverá existir nas nossas vidas, que queremos para nós, mas também para todos
os que connosco coabitam neste mundo. Uma prenda que comporte, em si mesma,
princípios, valores, sentimentos e emoções, mas também alguns bens materiais,
tão necessários à vida confortável e condigna.
Nesta reflexão de Natal, o seu autor desejará muito
ser o primeiro a pedir perdão a todas as pessoas que, por quaisquer circunstâncias
da sua vida, magoou, ofendeu e criticou injustamente. Fica claro que, da sua
parte, pede idêntico comportamento a quem de alguma forma também o lacerou,
afrontou e rejeitou, injusta e arbitrariamente, talvez, até, eventualmente, com
alguma crueldade.
Nesta quadra de grande solenidade para a família,
mas também de autêntica reconciliação, façamos todos um esforço: para sermos
retos, para adotarmos comportamentos assertivos, fidedignos e transparentes,
mesmo que tenhamos de “abdicar” de outros interesses, situações, pessoas e
“pseudoamizades”, porque a reconciliação também não pode ser “capitulação”
total e incondicional, a quem não tem estado, e continua a não estar connosco,
ou, pior do que isto, a quem quer estar connosco e com quem nos ofende.
Natal, festa da Família, da Reconciliação, do
Amor/Amizade. Que este ano o possamos usufruir em plenitude de liberdade,
qualquer que esta seja: política, religiosa, profissional, social, estatutária
ou de outra natureza. Todos temos o direito à diferença, todos devemos
respeitar as posições de cada pessoa, concordando ou não com as suas ideias,
atitudes e comportamentos, desde que não sejamos ofendidos, nem humilhados.
O Natal também deve ser recordado, por muito que nos
custe e faça sofrer, pela situação das centenas de milhares de migrantes, das
centenas de mortes, dos milhares de crianças que estão a sofrer autênticas
desumanidades, que não têm culpa nenhuma dos desmandos dos adultos, que nem
sequer pediram para nascer, mas que continuam a ser as vítimas mais frágeis
neste mundo.
A Europa, dita civilizada, ancestralmente defensora
dos valores humanistas, onde Portugal se inclui, não pode ficar indiferente a
esta catástrofe. Cabe aos povos das nações europeias, e não só, como também a
todos os governantes, entenderem-se na resolução da situação de quem está
diminuído em quase todas as suas dimensões humanas. Haja respeito, compreensão,
solidariedade, amor benevolência, compaixão e caridade pelos nossos irmãos
migrantes.
Nesta sublime quadra natalícia, deixo-vos sinceros
votos de Festas vividas com muita alegria, Felicidade, amor, serenidade e paz.
Que, no que for possível, nos reconciliemos, sem renunciarmos aos nossos
princípios, valores, sentimentos e emoções. Que sejamos capazes de praticar a
solidariedade, a amizade, a lealdade, sempre com humildade e gratidão,
principalmente para com as pessoas que já demonstraram estar incondicionalmente
do nosso lado, para o nosso bem-estar material e espiritual.
Diamantino
Lourenço Rodrigues de Bártolo
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