MATURIDADE (*) Ely Vieitez Lisboa



Muita idade não é sinônimo de maturidade. Que é ser maduro, adulto? Tudo é tão incerto, mutável, inseguro, que não se sabe nunca se a peça já começou, está no meio ou no final. Há uma distância enorme entre a sinopse que você propõe e o texto pronto que lhe é entregue. Há tramas e mistérios no ar, que mudam os temas do romance de sua vida, desvirtuam até atores e atrizes que eram apenas máscaras vazias. Na maratona da existência só há ponto de partida e uma inexorável bandeirada final. No durante, tudo são novidades, treinos, tentativas, reina o inesperado, rege a surpresa. Maturidade é sublimar os sonhos que morreram e criar outros, numa renitência de animal ferido e de Fênix renascida. É fazer do ensaio um passo de dança. Grande é a distância entre o desejado e o que se possui. Sonho e realidade não se coadunam? Quem manipula os loucos cordéis das desnorteadas marionetes? Aí vem o inaudito: a criatura sofrida, esmagada pela milésima decepção, sangrando mais uma vez, eternamente presa na armadilha do que é e não do que deveria ter sido, ressurge, renasce, ressuscita, toma o presente não pedido, transforma-o, muda-o, extrai diamante do carvão, bálsamo da madeira ferida. Isso é ser maduro. É reestruturar. É ter a coragem de recomeçar apesar de. É ser taumaturgo quando os milagres não mais existem. É o demiurgo que cria do nada. Ao seu redor, forças estranhas, invisíveis, intocáveis mudam constantemente as regras do jogo, trocam as peças do xadrez. Em compensação, o herói da história (eu / você / nós) não desiste. Ele volta, retorna, louco Sísifo sem causa, que não seja sua própria insanidade.
Impressiona-me, por que não pode haver harmonia entre os altos desígnios divinos e a vontade nossa. Conquista é sinônimo de dor e de chaga viva. Pagam-se por ela altos juros, ágios absurdos. Há qualquer coisa errada na fórmula, nos planos, pois o homem nasceu para a alegria, para o prazer. Todo ser humano alimenta-se de sonhos, joga para ganhar. Surgem, todavia, trapaça, a troca de caminhos, os fracassos, as desilusões. A vítima morre um pouco, nutrindo-se da dor autofagicamente. Aí está sua grandeza. Pode receber, então, o Atestado de Maturidade. Temperado como o aço, mas maduro. Repleto de cicatrizes, mas maduro. Gente grande, gente feita, obra acabada, dita à imagem e semelhança de Deus, divino como seu Criador, invencível, eterno.

Ely Vieitez Lisboa





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