O velho adágio português, segundo o qual: “a culpa morre solteira”, poderá
constituir o paradigma, no pior sentido, é verdade, do que não deve ser feito,
isto é, não se assumirem as responsabilidades pelos atos, omissões e decisões
que, respetivamente, se realizam e tomam, por uma pessoa, grupo ou instituição,
num determinado contexto.
A responsabilidade constitui um valor que, sendo
assumido por todos, contribui para uma vida social, a todos os níveis:
familiar, profissional, institucional, política, social e religiosa, mais
harmoniosa, justa e motivadora para um maior e melhor progresso comunitário;
fomentando, também, a confiança e credibilidade entre os cidadãos. Ser
responsável define o caráter, a personalidade, o saber-estar, o Saber-ser e o Saber-ser-sujeito,
pessoa de bem, em quem os outros podem acreditar, confidenciar e colaborar.
A assunção das responsabilidades, também poderá
facilitar a promoção de mais e melhor justiça, reduzir as desigualdades, e
promover a competência nos vários contextos da intervenção humana, porque
quando as pessoas, grupos, e/ou instituições enveredam por caminhos, cujo
percurso conduz a objetivos meramente individuais, “sem olhar a meios para atingir os fins”, ignorando os deveres, os direitos
e a dignidade dos outros, já se está no domínio da irresponsabilidade, todavia,
o inverso a que correspondem o dever do respeito, da não interferência negativa
nos projetos dos restantes concidadãos,
aqui sim, este último comportamento, revela, naturalmente, uma
personalidade responsável e credível, isto é, uma conduta verdadeiramente
ética, transparente e rigorosa.
Assumir, lealmente, a responsabilidade por
omissões, decisões, atos e respetivas consequências, revela uma conduta
inerente ao caráter reto, justo e bem-formado. Como em quaisquer outras
circunstâncias e atividades, Saber-ser-responsável implica, para além daqueles
atributos, possuir competência de análise dos próprios atos, e a correlativa
conduta, face ao resultado dos mesmos.
A conduta, que ao longo da vida, se manifesta numa
determinada pessoa humana, revela: princípios, valores, sensibilidades, caráter
e temperamento, na medida em que a conduta, ou postura, pode ser definida como: «A maneira de agir, actuar, comportar-se
em observância a princípios, valores, orientações e regras. (…). Conduta pode
ser considerada competência à medida que as pessoas têm consciência da sua
importância e sabem utilizá-la para alcançar objectivos e êxitos nas acções e
no trabalho.» (RESENDE, 2000:45).
Ignorar o dever de assumir a responsabilidade pelos
atos, omissões, decisões e correspondentes consequências, revela uma conduta
inaceitável, eventualmente censurável e, no limite, juridicamente condenável,
também sinónimo de incompetência, de descredibilizada, de insegurança e
desonestidades: intelectual, ética e moral, logo, a pessoa que assim procede, não
pode merecer a confiança dos seus concidadãos, não é uma pessoa competente para
zelar, defender e consolidar os direitos daqueles, será, portanto, prejudicial
à criação e manutenção de um ambiente: de solidariedade, de tranquilidade, de
lealdade e bom relacionamento interpessoal, quer no interior de uma família, de
uma instituição, qualquer que seja a natureza desta, quer, ainda, no seio da
própria comunidade. Possivelmente, e com a acuidade que se impõe, a atividade
política, também será suscetível de situações idênticas, o que, a verificar-se,
seria extremamente prejudicial para a democracia.
O princípio da conduta adequada, para observância
de uma ética da responsabilidade, poderá ajustar-se, a algumas situações que,
pela comunicação e opinião públicas, vêm ao conhecimento geral, eventualmente
existentes nos mais diversos campos da atividade humana: na empresa, nas
associações, na Igreja e, com mais notoriedade, na política. Infelizmente, no
domínio da atividade político-partidária, alguns casos divulgados pela
comunicação social, primam pela negativa, não se podendo, nem devendo, contudo,
generalizar.
Claro que as situações são diferentes e os percursos
também, como por exemplo: não procede bem o político que, de boa-fé é eleito
pelos seus concidadãos, com base em projetos que apresentou ao eleitorado, para
serem cumpridos, entretanto, e logo que se lhe coloca a primeira dificuldade,
ou lhe surge a oportunidade para ocupar um outro cargo, eventual e
aparentemente mais rentável, prestigiante e cómodo, abandona as funções para as
quais foi eleito democraticamente, ou nomeado, eximindo-se, por este processo,
desleal e nada ortodoxo, às responsabilidades que lhe seriam pedidas, e tinha o
dever de assumir.
É certo que determinados cargos são importantes
para uma localidade, ou um país e, portanto, para as respetivas populações,
mas, então, nestas circunstâncias, é necessário explicar muito bem: aos
eleitores, em particular; e aos cidadãos em geral, as vantagens decorrentes do
abandono de um cargo para assumir outro, porque de contrário, uma vez mais, “a culpa vai morrer solteira”.
Na atividade política, é relativamente fácil, ao
cidadão político-profissional, eximir-se às suas responsabilidades, defraudar
os eleitores e, logo a seguir, aqui sim, com toda a “competência” (?) e a mais insinuante demagogia, conseguir ser
novamente eleito. O povo anónimo é generoso, tolerante e honesto, por isso vai
acreditando e dando o seu voto, pelo menos até esgotar as oportunidades que
entende conceder ao candidato incumpridor.
O exercício de funções políticas, em cargos de
eleição direta, ou de nomeação legal, também apresenta bons exemplos de
excelentes condutas ético-morais, no que respeita a assumir responsabilidades,
por parte de muitos políticos que, leal e corajosamente, com humildade e
verdade, reconhecem os erros cometidos, retiram as devidas ilações das
consequências verificadas, decidindo pelo seu autoafastamentos, que até pode
ser estratégico, mas, quando se demitem de todos os cargos, direta ou
indiretamente relacionados com a situação que está na origem da sua decisão de
abandono, pelo menos, e durante um maior ou menor período de tempo, contribuem
e facilitam para e, respetivamente, na busca de novos protagonistas e soluções
diferentes. Esta conduta, revela dignidade, humildade e desapego ao cargo,
compatibilizando-se, ou harmonizando-se, com uma ética da responsabilidade
política.
Eximir-se à boa prática de uma ética da
responsabilidade política, é um erro que alguns talvez pratiquem, ainda que sem
terem a consciência da gravidade desse equívoco, portanto sem dolo.
Naturalmente que sendo um erro: de formação, de circunstância, de análise, de
estratégia, de hierarquia de valores, ou de qualquer outra natureza, é sempre
possível, pelo menos, tentar corrigi-lo, dar-lhe a dimensão adequada, sem o
recurso à extrapolação, à descontextualização e à crucifixação da pessoa que
errou, até porque: “só não erra quem nada
faz”, ou melhor, afinal, estes, também erram, pela simples circunstância de
“nada quererem fazer”.
Seja o erro intencional, ou não, sejam quais forem
as consequências, a verdade é que o erro não poderá ser o paradigma da conduta
humana, mas antes o seu contrário, isto é, o acertar, este sim, é próprio da
pessoa proceder bem, com ajuste, com intencionalidade de produzir os melhores
resultados: para o próprio, e para o todo; para o indivíduo, e para a
coletividade.
Na realidade, importa interiorizar, e divulgar, justamente
por uma conduta apropriada, uma cultura de análise positiva do erro, na medida
em que: «A expressão errar é humano
poderá, entretanto, ser dispensável como frequentemente justificativa para as
falhas, se cultivar a ideia de que errar faz parte do processo de aprendizagem
e erro, que dura a vida inteira. O erro deve ser encarado com mais
naturalidade. Especialmente por causa dos sentimentos negativos que se escondem
por trás dele.» (Ibid.:214).
A ética da responsabilidade política sugere, então,
uma conduta digna e proporcional: entre as decisões que devem ser tomadas e as
circunstâncias resultantes daquelas. Uma decisão que envolva o autoafastamento
da pessoa de determinados projetos, objetivos, funções e cargos, deve ser
tomada com humildade, sem vergonha, nem falsa modéstia. A conduta corajosa
será, então, muito mais apreciada, valorizada e, a curto ou médio prazos,
eventualmente, recompensada.
Ignorar os sentimentos, abandonar aqueles que
acreditaram na pessoa, nos seus projetos e objetivos, trocando por outras
funções, antes de reparar os prejuízos, morais e materiais, que causou à
instituição que representava, e aos cidadãos que nele confiaram, constitui um
erro grave, que se manterá como tal, como sinónimo de uma conduta inadequada.
Este tipo de erro, mantido por interesses próprios,
com o qual nada se aprende de bom, este sim, é inaceitável, censurável e não
comprova a natureza humana que, na expressão rossiniana: “é naturalmente boa”. Persistir, voluntária e conscientemente, no
erro pode significar: vaidade, arrogância, ganância, orgulho desmedido e
desrespeito pelos seus semelhantes, e por aqueles que sofrem as consequências
desse mesmo erro. É próprio de ditadores sem valores humanistas.
Evidentemente que o não cumprimento de promessas,
projetos e o abandono de cargos e funções para que se foi escolhido, poderá, em
circunstâncias excecionais, não constituir uma violação ética quanto às
responsabilidades a assumir, se por imperativos superiores, à vontade do
próprio, ou por interesse nacional com vantagens para a sociedade, tal decisão
tiver de ser tomada. Em todo o caso, será sempre uma situação-limite, e a
ponderar muito bem.
Ainda assim, o dever de respeito para com aqueles
que estiveram na origem da eleição de um determinado candidato, para um cargo
bem definido, impõe que sejam prestados todos os esclarecimentos e, na medida
do possível, quando as condições o permitem, questionar esse eleitorado,
através de um instrumento legal, se concorda, ou não, com o abandono do cargo
para que tinha sido eleito, a fim de ocupar outro, na localidade, no país ou
mesmo a nível internacional.
Em princípio, e quando situações daquela natureza
se colocam, deve-se evitar a absolutização dos factos como, igualmente, se deve
ter o maior cuidado na formulação de juízos de valor, da promoção de processos
de intenção, porque então, aqui sim, os deveres subjacentes a uma ética da
responsabilidade, podem ser violados, precisamente, por quem assumir uma
conduta extrema, sem dar oportunidade a que as pessoas se expliquem, se
justifiquem e solicitem a compreensão daqueles que, em certo momento, dependeu
para ascender a um determinado cargo.
A ética da responsabilidade não pode ser exigida
apenas num sentido. Todos serão chamados ao seu cumprimento, para que a
sociedade funcione com harmonia, confiança, compreensão e tolerância. Uma
sociedade ética que, mesmo nas circunstâncias mais difíceis, assume,
dignamente, as responsabilidades que lhe cabem.
Bibliografia
RESENDE, Enio, (2000). O
Livro das Competências. Desenvolvimento das Competências: A melhor Auto-Ajuda
para Pessoas, Organizações e Sociedade. Rio de Janeiro: Qualitymark
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