CHAMO-ME MEDITAÇÃO- Cremilde Vieira da Cruz

 Sou nem mais nem menos,
Que uma gaivota de asas partidas,
Perdida na ilha.

Não tenho espaço,
Nem lar,
Não tenho horas,
Nem tempo.

Existo aqui,
Mais uma sombra a cobrir a calçada,
Olhos perdidos na neblina das montanhas,
mãos estendidas para o mar.

Não tenho horizontes,
Nem o mar me pertence.
Não tenho qualquer ilusão!
 Mas amo a ilha,
Gosto de abraçar os jacarandás,
Gosto de passear-me nas avenidas de acácias...
 Às vezes abraçam-me as palmeiras,
Ou as buganvílias que cobrem as ribeiras.
 Há um til que me segreda palavras verdes,
E às vezes,
Se me passeio pelos canaviais,
Sinto um certo aroma a doçura.

Fascinam-me os socalcos verdes,
As levadas que me servem de espelho,
As avenidas de bananeiras,
O mar à volta de mim.

Muitas vezes,
Medito no negrume do calhau...
 Deslumbra-me a imponência dos rochedos,
As grutas respingadas de água cristalina,
Os furados que dão acesso ao outro lado.
Sinto como se partisse para o desconhecido.

Faz-me meditar o nevoeiro tombado do céu,
O luar em noites mornas...

Não sou ninguém.
Existo aqui.
Chamo-me meditação.

 1988

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